quinta-feira, 26 de maio de 2011

Criado novo parâmetro para medir felicidade




A felicidade é supervalorizada? Martin Seligman agora acha que sim, o que pode parecer uma posição estranha para o fundador do movimento da psicologia positiva. Como presidente da Associação Psicológica Americana no final da década de 1990, ele criticou os colegas por se concentrarem exclusivamente em doenças mentais e outros problemas. Ele os incentivou a estudar as alegrias da vida e escreveu, em 2002, um best-seller, “Felicidade Autêntica”.

Agora, porém, ele lamenta aquele título. À medida que a investigação da felicidade avançou, Seligman começou a ver certas limitações no conceito.
Por que os casais têm filhos mesmo quando os dados mostram claramente que pais são menos felizes do que casais sem filhos? Por que os bilionários buscam desesperadamente mais dinheiro mesmo não querendo fazer nada com ele? E por que algumas pessoas continuavam jogando bridge sem alegria? Seligman, ávido jogador, sempre os notava nas competições. Nunca sorriam, nem nas vitórias. Elas não jogavam para ganhar dinheiro ou fazer amigos. Elas não saboreavam a sensação de engajamento total numa tarefa que os psicólogos chamam de fluxo. Elas não sentiam a satisfação estética de jogar uma mão com inteligência e “ganhar bonito”. Estavam dispostas a ganhar feio, às vezes até recorrendo à trapaça.
“Essas pessoas queriam vencer somente por vencer, mesmo sem causar uma emoção positiva”, afirma Seligman, professor de psicologia da Universidade da Pensilvânia. “Elas pareciam administradores de fundos hedges que só querem acumular dinheiro e brinquedos pelo acúmulo em si. Vendo-os jogar, vendo-os trapacear, eu ficava pensando que a realização é um desejo humano em si”.

Cinco elementos para se sentir bem
Essa sensação de realização contribui para o que os antigos gregos chamavam de “eudaimonia”, que em linhas gerais pode ser traduzido como “bem-estar” ou “florescente”, conceito que Seligman pegou emprestado como título de seu novo livro, “Flourish”. Ele também elencou os cinco elementos cruciais do bem-estar, todos buscados por si mesmos: emoção positiva, engajamento (a sensação de perder-se numa tarefa), relacionamentos, significado e realização.
“O bem-estar não pode existir somente na sua cabeça”, ele escreve. “O bem-estar é uma combinação entre sentir-se bem e de também ter sentido, bons relacionamentos e realização”.
O movimento da psicologia positiva inspirou pesquisas ao redor do mundo sobre o estado mental das pessoas, como um novo projeto na Grã-Bretanha para medir o que David Cameron, o primeiro-ministro, chama de bem-estar geral.
Seligman se diz feliz ao ver os governos medindo algo além do PIB, mas se preocupa como o fato de essas pesquisas perguntarem principalmente sobre a “satisfação com a vida”.
Em teoria, a satisfação com a vida pode incluir vários elementos de bem-estar, mas na prática, segundo Seligman, as respostas das pessoas àquela pergunta são amplamente – mais de 70 por cento – determinadas por como elas estão se sentindo no momento da pesquisa, não como avaliam suas vidas no geral.
“A satisfação com a vida mede essencialmente estados de ânimo alegres, então não serve como ponto central em qualquer teoria que busque ser mais do que uma 'felicidadelogia”', ele escreve em “Flourish”. Tomando isso como padrão, ele observa, um governo poderia melhorar seus números distribuindo o tipo de droga euforizante que Aldous Huxley descreveu em “Admirável Mundo Novo”.
Países mais e menos felizes
Então o que deveria ser medido? Por ora, a melhor escala florescente, segundo o autor, vem de um estudo em 23 países europeus feito por Felicia Huppert e Timothy So, da Universidade de Cambridge. Além de questionar os entrevistados sobre seu estado de espírito, os pesquisadores também perguntaram sobre relacionamentos com outras pessoas e a sensação de estar realizando algo compensador.
Dinamarca e Suíça tiveram os índices mais altos na Europa, com mais de um quarto dos cidadãos encaixando-se na definição do conceito florescente.
Perto do fim, com menos de 10 por cento do conceito florescente, ficaram França, Hungria, Portugal e Rússia. Não existe comparação disponível com os Estados Unidos, embora alguns pesquisadores digam que os americanos se sairiam razoavelmente bem por causa de sua noção de realização.
O economista Arthur Brooks observa que 51 por cento dos americanos dizem estar muito satisfeitos com os empregos, uma porcentagem mais alta do que em qualquer país europeu, menos Dinamarca, Suíça e Áustria. Em seu livro de 2008, “Gross National Happiness” (“felicidade nacional bruta”, em tradução livre), Brooks argumenta que o fundamental para o bem-estar não é o nível de alegria que se sente nem quanto dinheiro se ganha, mas o significado que se encontra na vida e a sensação de “sucesso adquirido” – a crença de que se criou valor na própria vida e na dos outros.
“As pessoas encontram um significado ao amar incondicionalmente os filhos”, escreve Brooks, presidente do American Enterprise Institute.
“Paradoxalmente, a felicidade aumenta pelo fato de se estar disposto a tê-la diminuída ao longo dos anos de fraldas sujas, ataques de raiva e respostas rudes. A disposição de aceitar a infelicidade por causa dos filhos é uma fonte de felicidade”.
Alguns pesquisadores da felicidade sugeriram que os pais se iludem com as alegrias das crianças; eles se concentram nos momentos brilhantes e esquecem-se da trabalheira mais frequente. Porém, Seligman afirma que os pais, sabiamente, estão procurando algo mais do que sentimentos felizes. “Se só quiséssemos emoções positivas, nossa espécie teria acabado muito tempo atrás. Temos filhos para perseguir outros elementos do bem-estar. Nós queremos ter sentido na vida. Queremos relacionamentos”.
Segundo Seligman, ao observar a necessidade das pessoas por realização, ele se lembrou de seus primeiros experimentos famosos que identificaram o conceito de “desamparo aprendido”. Ele descobriu que quando animais ou pessoas recebiam uma série de castigos ou recompensas arbitrários, eles paravam de tentar fazer coisas construtivas.
“Vimos que mesmo quando aconteciam coisas boas que não eram merecidas, como moedas saindo de um caça-níqueis, o bem-estar não aumentava. Só produzia desamparo. As pessoas desistiam e se tornavam passivas”.

Como chegar lá
Para evitar esse tipo de mal-estar, Seligman recomenda olhar os elementos básicos do bem-estar, identificar quais são os mais importantes para você, estabelecer metas e monitorar o progresso. Para ele, o simples registro de quanto tempo se gasta diariamente perseguindo cada objetivo pode fazer a diferença porque é fácil ver discrepâncias entre as metas e aquilo que fazemos.
Também é possível começar a questionar alguns dos objetivos e atividades, do jeito que Seligman às vezes se pergunta por que passa tanto tempo jogando bridge. Ele obteve algumas conquistas claras, como um segundo lugar no campeonato norte-americano de duplas, mas o autor não finge que o bridge dê algum sentido à vida. Ele diz jogar por causa de outro elemento do bem-estar, a sensação de engajamento. “Entro no fluxo jogando bridge, mas depois de um torneio longo, quando me olho no espelho, temo estar apenas me atormentando até morrer”.
Jogar pelo sentimento de fluxo vale mais a pensa do que simplesmente pelo de ganhar? Seligman não quer julgar. “Minha visão da psicologia positiva é a de que ela descreve mais do que prescreve o que os seres humanos fazem. Não quero criar confusão com os valores das pessoas. Não estou dizendo que é bom ou ruim querer ganhar em si. Só estou descrevendo o que muita gente faz. A função de um terapeuta não é mudar os valores das pessoas, mas sabendo o que valorizam, torná-las melhores nisso”.


Entrevista com Martin Seligman: "Perseguir só a felicidade é enganoso" concedida a Revista Época


Nenhum comentário: